Perfumaria Árabe, palestra com Julia de Biase

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Na quarta, dia 19/03, aconteceu no Espaço BibliAspa a palestra “Fragrâncias do Oriente Médio: História e Cultura da Perfumaria Árabe”, como parte do calendário de eventos da 5ª edição do Festival Sul-Americano de Cultura Árabe (veja mais sobre os eventos e programação completa aqui). A palestrante foi a simpática e linda Julia de Biase que trouxe para as terras tupiniquins a marca  Asgharali, que iniciou no ramo da perfumaria 1924.

Bom, saí eu correndo do trabalho (as 19:00 para chegar lá as 19:30), peguei metrô lotado, subi a Rua Alburquerque Lins como se não houvesse amanhã. Estava a metros de distância da BibliAspa e já comecei a ser conduzida por um aroma quase hipnótico, denso, rico, quase palpável: bakhoor

Fui muito bem recebida, a BibliAspa é um espaço incrível, recomendo a visita! Engraçado, ao chegar comentei que estava ali pela palestra e que fui praticamente ‘levada’ ao lugar pelo perfume que se alastrava pelas imediações. Me responderam que essa era a intenção…

Além de tudo encontrei a amiga moderadora dos grupos da APP (Apaixonados por Perfumes), a Elaine! Que prazer assistir a uma palestra tão interessante ao lado de uma pessoa tão querida! A noite prometia, de fato!

Logo a palestra iniciou, com a Julia contando sobre sua ‘imersão’ no mundo dos perfumes do Oriente Médio: em 2008 fez uma viagem a tais países e lá foi praticamente ‘abduzida’ (palavras dela!) por aqueles aromas tão presentes, tão ricos, tão especiais! Diferente da perfumaria ocidental, onde tudo é produzido em larga escala de forma a atender multidões, a perfumaria árabe é artesanal, carrega significados especiais para cada pessoa e é preciosa: da embalagem aos ingredientes!

A palestra nos fez viajar pela história da perfumaria: nos levou até o Egito dos faraós, do kyphi, onde os aromas eram sinônimos de riqueza e nobreza e elo de ligação do homem com as Divindades. Estavam presentes no cotidiano dos faraós e de pessoas de classe social elevada. Os bálsamos, unguentos, incensos e demais produtos aromáticos estavam nas paredes dos templos, e eram ofertados aos Deuses. Aliás, o Egito deixou sua influência e tradições sobre a produção de perfumes, cosméticos e remédios para todo o Oriente!

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Vimos que a mais famosa das rainhas – Cleópatra – fazia dos aromas sua arma de sedução – e fazia bem feito – afinal, Marco Antônio e Júlio César não eram pra qualquer uma! Dois dos homens mais poderosos do mundo! Os faraós, a nobreza e outras pessoas importantes na sociedade egípcia, após a morte, eram mumificadas com os mais finos óleos e bálsamos aromáticos e levavam para sua viagem jarros, frascos cheios de substâncias aromáticas para que os Deuses reconhecessem suas almas através de seu aroma… Dizem que quando descobrirem o mausoléu de Tutankamon, um jarro foi aberto (após ter ficado lacrado por aproximadamente 3.300 anos) e dele exalou um intenso aroma de perfume!

Os egípcios utilizavam especiarias, flores, plantas, óleos e gordura animal na produção de seus bálsamos perfumados. Era costume das mulheres da nobreza usar no topo da cabeça cones de gordura impregnados de substâncias aromáticas que, com o calor do corpo e do ambiente, iam derretendo, perfumando e hidratando os cabelos…

 

Do Egito fomos para a Índia, onde até hoje a perfumaria é artesanal e também está relacionada ao culto religioso. Muitas estátuas de divindades hindus são untadas com óleos preciosos e aromáticos. A Índia tem a maior variedade de jasmins e ele é muito utilizado na decoração de seus altares e as mulheres costumam usar suas flores nos cabelos. Lá a utilização do incenso sempre foi muito forte e também fazia o elo de ligação entre o homem e seus Deuses.

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Só por curiosidade: no ritual do maithuna,que é o ato sexual ritualizado parte do Yoga Tântrico ou outras práticas Tântricas, recomenda-se o uso do mais puro óleo de jasmim nas mãos, óleo de patchouli no pescoço e faces, âmbar ou almíscar sintéticos nos seios e nos órgãos sexuais; extrato de valeriana no cabelo, óleo de sândalo nas coxas e perfume de açafrão nos pés da Shakti (mulher). No Shiva (homem) aplica-se sândalo na testa, pescoço, barriga, peito, genitais, braços, pernas e pés..

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Segue link sobre a produção atual de perfumes na Índia, infelizmente ameaçada pela ‘industrialização’ do processo.

Demos um pulinho na China e Japão, e vimos que a maior contribuição chinesa para o mundo da perfumaria foi a invenção da porcelana, que era utilizada para armazenar fragrâncias. Muitos materiais já foram usados para o armazenamento de substâncias aromáticas, entre elas o alabastro, madeira, ossos, cerâmica. Mas  não podemos negar que, sem dúvidas, o material que revolucionou o modo de armazenamento de tais produtos foi o vidro, descoberta atribuída aos fenícios.

Fomos para Roma e descobrimos o amor dos romanos pelos perfumes e aromas! Em suas festas e banquetes os convidados lavavam as mãos em água de rosas, as mesas eram enfeitadas com guirlandas e pétalas de flores. Era última moda por lá perfumar os cavalos e as solas das sandálias, para deixar aquele delicioso rastro… Pompéia, esposa de Nero ao falecer, não teve o corpo cremado, mas estufado com ervas aromáticas, embalsamado e colocado no Mausoléu de Augusto. Nero concedeu a esposa honrarias divinas, e acredita-se que teria queimado o equivalente à produção de dez anos de incenso da Arábia.

Como deixar de falar dos banhos romanos seus rituais de beleza e uso dos ‘poderes’ dos aromas?

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Visitamos brevemente os povos semitas (seus principais representantes eram os árabes e os hebreus), que também valorizavam substâncias aromáticas e também faziam ligação das mesmas com seus ritos religiosos. Na Bíblia temos a passagem sobre os presentes dados os Menino Jesus, a mirra e o incenso, tão valoroso quanto o ouro. Em outro momento, quando já adulto, Jesus tem os cabelos untados com o mais raro (e caro) óleo de nardo, e em outra passagem tem seus pés lavados com essências por Maria Madalena. O Cântico dos Cânticos, o que dizer? Um ode aos aromas!

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Chegamos enfim nos países Árabes! Segundo Julia, em cada comércio, hotel, residência, existem incensários que exalam os mais variados aromas e que inebriam, intoxicam, deleitam! Os árabes, aliás, através do comércio que realizavam com outras regiões com suas caravanas, ajudaram a difundir do Egito para outros países a cultura da perfumaria. Traziam também matérias primas preciosas!

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E os perfumes? Puros extratos vendidos a granel em frasquinhos de acordo com o ‘gosto do freguês’! Nesses países tudo é perfumado, até mesmo os alimentos. Um exemplo? Os árabes fizeram da água de rosas, produto resultante da destilação aprimorada pelo médico, alquimista (e gênio) Avicena ingrediente de diversas preparações culinárias! Alguns homens que enfrentam problemas com sua virilidade costumam ingerir óleo de rosas (o chamado attar) junto com seus alimentos, pois segundo a medicina árabe tal óleo vai devolver ‘a força’ perdida… E agora somente me lembro do que foi dito antes, dos imperadores chineses que faziam suas concubinas ingerirem pedaços de almíscar para que, durante o ato sexual, o suor das mesmas cheirasse a tal substância… Bom, não sei vocês, mas eu comia fácil… naquela época, pois hoje produtos de origem animal são praticamente abolidos da perfumaria.

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Outras curiosidades: nas construção das mesquitas eram utilizados ‘bolotas’ de almíscar entre as estruturas das paredes, para que exalassem aroma quando o sol aquecesse o templo.

Minha nossa, foi tanta coisa…  tanta informação, tanta história! Já começa a me falhar a memória! Ao terminar a palestra, Julia abriu espaço para discussão e nos falou a respeito do mito do ‘fixador’ dos perfumes. Isso não existe. Viu, gente, NÃO existe. O que vai determinar o poder de fixação do perfumes são os ‘ingredientes’, as notas utilizadas em sua base, se mais ou menos persistentes.

Falou ainda sobre a infante perfumaria brasileira, que ainda não sabe ao certo como utilizar suas matérias primas, não criou ainda uma ‘identidade’. Plenamente de acordo, Julia…

Desmitificou o uso de colônias em locais de clima quente, afinal, mais quente que o Saara vai ser difícil… e lá os perfumes são intensos e persistentes. Inclusive, falou que o perfume nos países árabes é uma das poucas formas que as mulheres, vestidas da cabeça aos pés, têm de chamar a atenção para si! É o perfume e o olhar… E quer combinação mais instigante?

E pensa que acabou? Nada… A palestra ainda contava com uma IMENSA e MAGNÍFICA exposição (e mais: experimentação) de perfumes do Oriente. Frascos, incensários, bahkoor, perfumes sólidos, extratos, perfumes com base de óleos e não de álcool (aliás, hábito esse da perfumaria ocidental). Tirei fotos que seguem abaixo, mas não fazem jus ao que vi. Quanta beleza, quanto capricho e luxo! Cada frasco é uma jóia! E os aromas… me senti uma criança descobrindo novos sabores, odores, texturas. Esqueci tudo o que conheço sobre rosas, vetiver, patchouli, olíbano. São inebriantes, diferenciados, êxtase olfativo! cada vidrinho-jóia escondia um mundo, um mistério, uma sensação!

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Não saberia descrevê-los como faço com perfumes ocidentais. Identifiquei notas? Sim, algumas. Mas é tudo tão diferente, tudo tão particular que me fizeram viajar para longe…

Além de tudo isso, amigos, ganhamos uma generosa e deliciosa amostra dos perfumes Asgharali.

Agradeço demais a oportunidade, o verdadeiro presente que recebemos da BibliAspa e da Julia de Biase, que foi a palestra e a oportunidade de conhecer tais tesouros tão desconhecidos dos público brasileiro! Obrigado a todos os envolvidos na realização desse fantástico evento que nos aproxima da milenar e riquíssima cultura Árabe!

Shukran!

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O post está cheio de links, e explico o motivo: alguns assuntos abordados na palestra já foram discutidos aqui no blog, então, quem tiver interesse, fica mais fácil acessar!

Elaine querida, descaradamente roubei suas fotos do álbum da APP! Me desculpa?

18 comentários sobre “Perfumaria Árabe, palestra com Julia de Biase

  1. Comentários mais que perfeitos Diana, uma ilustração magnífica de tudo que ouvimos naquela palestra que nos enriqueceu mais ainda. A sua companhia também é muito agradável e, espero que tenhamos mais oportunidades para desfrutar desse mundo maravilhoso que é a perfumaria…Agradeço pela companhia que foi sensacional. bjos

  2. Querida Diana, nós que agradecemos a presença de todos que participaram e dividiram de nossa paixão.
    Para quem não pode ir ou deseja rever com mais tempo, ainda há a oportunidade de visitar a exposição dos perfumes até a próxima semana!
    Beijos!

  3. Adorei ver registrado um resumo da palestra da Julia. É uma forma de não se perder nenhum detalhe de uma jornada tão significativa como a do perfumes do Oriente ao longo dos milênios. Beijos, Edna Jardim

  4. Diana sempre nos privilegiando com sua memória inacreditável!

    Conheci a Julia num curso que fizemos juntos, eu ainda para começar o 1 nariz. Um absurdo os frascos como jóias, a profundidade dos perfumes, uma viagem para outros lugares.

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